Ex-presidente e sete aliados foram condenados por crimes relacionados à tentativa de golpe; definição das penas ocorrerá na fase de dosimetria
por Plantão Jamildo.com
Publicado em 11/09/2025, às 18h44 - Atualizado às 19h12
Por 4 votos a 1, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou, nesta quinta-feira (11), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete réus pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Os ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Flávio Dino e Alexandre de Moraes, relator do caso, votaram pela condenação. O ministro Luiz Fux divergiu e defendeu a absolvição. Esta é a primeira vez que um ex-presidente da República é condenado por tentativa de golpe de Estado na história do país.
As penas ainda serão definidas na etapa seguinte do julgamento, conhecida como dosimetria, quando os ministros debaterão a duração e o regime das condenações. Somados, os crimes podem resultar em até 43 anos de prisão.
Além de Bolsonaro, a decisão atinge ex-ministros, militares e ex-dirigentes de órgãos de Estado. São eles:
A maioria pela condenação foi alcançada com o voto da ministra Cármen Lúcia, a primeira a se manifestar na sessão desta quinta. Ela considerou haver “prova cabal” de que Bolsonaro liderou um grupo para tentar abolir o Estado Democrático de Direito.
“A Procuradoria fez prova cabal de que grupo liderado por Jair Messias Bolsonaro, composto por figuras-chave do governo, das Forças Armadas e órgãos de inteligência, desenvolveu e implementou plano progressivo e sistemático de ataque às instituições democráticas com a finalidade de prejudicar a alternância legítima de poder nas eleições de 2022 e minar o livre exercício dos demais Poderes Constitucionais”, disse a ministra.
Antes de apresentar o mérito de seu voto, Cármen Lúcia rejeitou argumentos da defesa sobre cerceamento de defesa, anulação da delação premiada de Mauro Cid e a suposta incompetência do STF para julgar o caso. Ela afirmou manter desde 2007 o entendimento de que a Corte pode analisar ações penais que envolvem réus com prerrogativa de foro.
Na sustentação, a ministra frisou que o julgamento deve ser conduzido de forma imparcial, sem ceder a pressões políticas.
“Toda ação penal, especialmente a presente, impõe julgamento justo. O que há de inédito talvez nesta ação penal é que nela pulsa o Brasil que me dói. A presente ação penal é quase o encontro do Brasil com o seu passado, com o seu presente e com o seu futuro”, afirmou.
O ministro Cristiano Zanin também entendeu que houve tentativa de golpe e destacou a continuidade do projeto de poder do grupo após as eleições de 2022.
“A estabilidade da organização, e o próprio direcionamento das ações antes e depois das eleições de 2022, revela a continuidade do projeto em torno do escopo maior da organização, que era a manutenção de grupo específico no poder, independentemente da vontade popular”, afirmou.
Zanin citou os atos de 8 de janeiro de 2023 como exemplos de violência e de grave ameaça às instituições. "A ação dos executores tinha como escopo demonstrar elevado grau de instabilidade política, a ponto de justificar decretos de exceção.”
Relator da ação, o ministro Alexandre de Moraes classificou Bolsonaro como “líder da organização criminosa” e destacou que a tentativa de golpe não se limitou a discursos.
“O réu Jair Messias Bolsonaro exerceu a função de líder da estrutura criminosa, e recebeu ampla contribuição de integrantes do governo federal e das Forças Armadas, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para a implementação de seu projeto autoritário de poder”, afirmou.
Moraes ressaltou que a legislação penal considera crime a mera tentativa de golpe. “Não confundamos a consumação do golpe com consumação do crime de golpe de Estado. São coisas diversas. A mera tentativa consuma o crime.”
Ele ainda lembrou episódios envolvendo declarações públicas do ex-presidente. “O líder desse grupo criminoso deixa claro, de viva voz, que jamais aceitaria uma derrota nas urnas”, disse Moraes, em referência a declarações de Bolsonaro de que deixaria a Presidência apenas “preso, morto ou vitorioso”, afirmou.
O ministro Flávio Dino acompanhou o relator, mas diferenciou a participação de alguns réus. Ele considerou haver menor envolvimento de Alexandre Ramagem, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, apontando que defenderá penas mais brandas para eles.
Por outro lado, Dino destacou a liderança de Bolsonaro e Braga Netto no esquema. “Foram os coordenadores e arquitetos do plano golpista”, disse, acrescentando que a Constituição não permite anistia para crimes contra a democracia.
Único a divergir, o ministro Luiz Fux defendeu a absolvição de Bolsonaro e da maioria dos réus. Em um voto de mais de 11 horas, ele argumentou que não há provas suficientes de participação direta do ex-presidente na tentativa de golpe.
“Não se pode aceitar a pretensão acusatória de se imputar ao réu a responsabilidade por crimes cometidos por terceiros no fatídico 8 de janeiro de 2023 como decorrência de discursos e entrevistas ao longo do mandato”, disse Fux.
Para o ministro, os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral não configurariam tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.
Segundo a denúncia, assinada pelo subprocurador Paulo Gonet, Bolsonaro teria liderado, entre 2021 e 2023, um grupo que discutia medidas para anular o resultado eleitoral. O órgão aponta reuniões com militares, transmissões ao vivo contra o sistema eletrônico de votação e a edição de documentos que dariam respaldo jurídico a uma ruptura institucional.
A PGR também sustenta que o ex-presidente tinha conhecimento e concordância com o plano denominado “Punhal Verde e Amarelo”, que previa atentados contra Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes. Além disso, a acusação cita suposto uso irregular de informações da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF) durante o pleito de 2022.
A defesa de Bolsonaro, coordenada pelo advogado Celso Vilardi, afirma que os fatos narrados não configuram crimes, mas “atos políticos” ou “preparatórios impuníveis, sem violência ou grave ameaça”. O ex-presidente defendeu que apenas discutiu “possibilidades” com as Forças Armadas, em um contexto que, segundo ele, estava dentro da Constituição.
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a pena do ex-presidente Jair Bolsonaro em 27 anos e 3 meses. A condenação inclui 24 anos e 9 meses de reclusão e 2 anos e 6 meses de detenção, além de 124 dias-multa, calculados no valor de um salário mínimo cada. O regime inicial será o fechado.
Bolsonaro foi condenado por cinco crimes: liderança de organização criminosa, tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Trata-se da primeira condenação de um ex-presidente por tentativa de golpe de Estado no Brasil, com base em lei sancionada pelo próprio Bolsonaro em 2021.
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