Quinto Constitucional, a cota de gênero e a limitação das vagas para mulheres

Mais vagas para mulheres são um problema para a Justiça em todo o Brasil

Fabiana Leite | Publicado em 03/11/2024, às 14h55

Fabiana é advogada - Divulgação
Fabiana é advogada - Divulgação

Fabiana Leite é advogada e candidata à desembargadora do TJPE pelo quinto constitucional da advocacia

A mais importante missão do Direito é a promoção da Justiça. Um conceito que se manifesta em vários níveis, desde a possibilidade de defesa para alguém, à promoção da igualdade, compreendendo que diferenças sempre desfavorecem alguns grupos.

Portanto, se para algumas camadas os acessos são muito mais difíceis, para outras observamos o trajeto inverso, cheio de atalhos que vêm sendo utilizados durante décadas, mas que não podem mais ser naturalizados.

Em algumas semanas advogadas e advogados vão às urnas para eleger novos dirigentes da OAB, em disputas que mobilizam todos os olhares do universo Jurídico.

Porém, no mesmo dia, a advocacia pernambucana vai votar também na composição da lista sêxtupla para a vaga de desembargador (a) do Tribunal de Justiça do Estado, destinada ao Quinto Constitucional. Um cargo de extrema importância para a garantia da qualidade da nossa democracia.

É fundamental que este processo assegure a possibilidade de mais mulheres terem acesso ao cargo de desembargadora, tradicionalmente ocupada por maioria de homens.

Hoje, o TJPE conta com 52 desembargadores, sendo apenas 2 mulheres.

Ou seja, não representamos sequer 10% do colegiado. Uma diferença abissal, quando comparamos com a advocacia ou com a sociedade.

Mesmo com alguns avanços importantes, como a reserva para a inclusão do conceito de etnia/raça, cabe chamar a atenção para uma distorção nas regras postas esse ano. E aqui, vale uma explicação, até para  quem não é do campo do Direito possa compreender o que está acontecendo.

Advogadas e advogados do Estado registram suas candidaturas para a eleição de uma lista com seis nomes.

A votação ocorre junto com a eleição da OAB. São, ao todo, 24 nomes pleiteando o quinto constitucional, sendo 15 mulheres e 9 homens. Este dado, visto friamente, parece indicar que haverá uma predominância feminina na lista sêxtupla. A aparência, porém, se desfaz quando analisadas as condições.

Para que exista paridade, estão asseguradas vagas para profissionais pardas/pretas e pardos/pretos, sendo, no mínimo, uma para homens e outra para mulheres. Porém, quando olhamos para o critério geral de vagas femininas, percebemos no texto que estão confirmadas as possibilidades de observar o percentual de 50% (cinquenta por cento) para cada gênero.

Ou seja, um teto foi estabelecido para a entrada de mulheres na relação, ou seja, pelas regras postas somente “até” três podem ser eleitas. Quando termo correto, logicamente, seria “pelo menos” "mínimo" 3 mulheres, estabelecendo apenas o piso e não o limite. Uma palavra que parece pouca coisa, mas que muda completamente o conceito de representatividade.

Do jeito que está colocado, é certo que teremos ao menos metade da lista formada só por homens. Sendo assim, mesmo que as mulheres liderem a preferência da categoria, apenas 3 vão compor a relação final, pois as 3 demais vagas estão reservadas para os homens.

É fato que as cotas de gênero apresentam uma medida essencial para promover a igualdade e inclusão das mulheres nos espaços de poder. No entanto, é crucial que essas cotas sejam tratadas como um mínimo necessário — um piso — e não como um teto que restrinja o número de mulheres, e esse entendimento é fundamental para que o propósito de incluir mais mulheres em instâncias decisórias seja plenamente realizado.

Se quisermos lugares de decisão, precisamos ficar ainda mais atentas e ativas para o que chamamos de “limite invisível”: barreira sutil que, ao invés de acolher mais mulheres, limita e encerra seu crescimento nas esferas de influência, mantendo o status quo.

É preciso entender que as cotas mínimas para além da garantia numérica, promovem uma mudança cultural ao demonstrar que a presença feminina é um direito, e não uma concessão, e reafirmam que as mulheres devem ser parte ativa e crescente nos processos decisórios, criando oportunidades que rompem com a sub-representação e reforçam que o poder deve estar ao alcance de todas e todos, refletindo a pluralidade da sociedade.

E essa mobilização começa agora, com a oportunidade da chegada de uma mulher para o cargo de desembargadora do Tribunal de Justiça de Pernambuco.

@blogdojamildo