Moraes derruba leis em Garanhuns e Petrolina sobre debate de gênero em escolas; entenda

STF discutiu leis que proibiam discussões sobre gênero em escolas públicas. Garanhuns e Petrolina foram duas das cidades envolvidas

Cynara Maíra

por Cynara Maíra

Publicado em 17/10/2025, às 08h35 - Atualizado às 09h59

Foto do ministro Alexandre de Moraes, um homem branco, careca. Com o olhar franzido, Moraes olha para frente e está de terno
Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) criticou leis que proibiam debate de gênero nas escolas - Marcelo Camargo/Agência Brasil

Decisão: O STF declarou inconstitucionais as leis de Garanhuns (Lei 4.432/2017) e Petrolina (Lei 2.985/2017) que proibiam o debate sobre gênero e orientação sexual nas escolas.

Argumento Principal: Os ministros entenderam que os municípios invadiram a competência exclusiva da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional.

Leis Vetadas: As normas proibiam o uso de materiais didáticos e a realização de atividades pedagógicas sobre o que chamavam de "Ideologia de Gênero" em escolas e bibliotecas públicas.

Contexto: O julgamento unificou ações que tramitavam no STF desde 2018, propostas pela PGR e pelo PSOL.

Posicionamento: A Prefeitura de Petrolina afirmou que irá cumprir a decisão do STF. Garanhuns não respondeu aos contatos.

Na quarta-feira (15), o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucionais as leis municipais de Garanhuns e Petrolina que proibiam a abordagem de temas sobre gênero e orientação sexual na rede pública de ensino.

A decisão feita com unanimidade no plenário da Corte, derrubou a Lei nº 4.432/2017 de Garanhuns e a Lei nº 2.985/2017 de Petrolina.

O julgamento analisou duas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) que questionavam as normas pernambucanas e uma similar do município de Tubarão (SC).

O entendimento do STF foi de que os municípios usurparam a competência da União para legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional.

Após a decisão, o Jamildo.com procurou a Prefeitura de Petrolina que informou que "respeita o judiciário e vai cumprir a decisão do STF".

A gestão de Garanhuns afirma que ainda não foi comunicada oficialmente pelo STF, mas que segue rigorosamente as diretrizes e orientações estabelecidas pelo Ministério da Educação, sempre com o compromisso de assegurar uma educação pública de qualidade. 

"Reafirmamos, ainda, que a Rede Municipal de Ensino tem como princípio fundamental ser um espaço de inclusão, acolhimento e respeito à diversidade", diz a nota. 

O que diziam as leis derrubadas

Sancionadas em 2017, as leis tinham como alvo o que os textos chamavam de "Ideologia de Gênero".

  • Em Petrolina, a lei de autoria do vereador Elias Passos Jardim foi sancionada pelo então prefeito Miguel Coelho. O texto proibia na grade curricular "toda e qualquer disciplina que tente orientar a sexualidade dos alunos ou que tente extinguir o gênero masculino ou feminino como gênero humano". A norma também vetava a utilização e distribuição de livros sobre "ideologia de gênero, diversidade sexual e educação sexual" em escolas e bibliotecas municipais.

  • Em Garanhuns, a lei sancionada pelo então prefeito Izaías Régis Neto vedava a abordagem, direta ou indireta, sobre a temática em práticas pedagógicas, definindo o conceito como a ideia de que os sexos masculino e feminino "são considerados construções culturais e sociais". A proibição também se estendia a qualquer material sobre o tema em escolas e na biblioteca pública.

Os argumentos do STF

A maioria dos ministros seguiu o entendimento de que os municípios não podem legislar sobre conteúdo pedagógico.

O ministro Alexandre de Moraes classificou as leis como um "retrocesso civilizatório" e uma forma de censura.

"Não é possível fingir, inclusive para as crianças, que não existem pessoas trans, que não existem travestis, que não existe diferença de gênero. Não é possível nessa altura do século XXI", afirmou. Ele argumentou que esconder a realidade não protege a infância e que a educação séria é o "antídoto" contra o discurso de ódio.

O ministro Flávio Dino concordou que a proteção das crianças contra a "hipersexualização" é uma preocupação justa, mas que ela não se confunde com o debate sobre gênero. Ele defendeu que a deliberação sobre temas educacionais deve ocorrer em âmbito federal para garantir a coerência do sistema nacional de ensino e evitar 5.570 legislações diferentes sobre o mesmo tema.

Nunes Marques, que havia pedido destaque para levar o caso ao plenário físico, votou pela inconstitucionalidade por reconhecer a incompetência dos municípios, mas ressalvou que a exposição de crianças a conceitos abstratos como identidade de gênero desvinculada do sexo biológico poderia gerar uma "sobrecarga cognitiva".

O ministro Cristiano Zanin apontou uma divergência técnica, afirmando que a proibição em bibliotecas públicas configurava uma inconstitucionalidade material (de conteúdo), mas não formal, já que os municípios poderiam regulamentar o funcionamento desses espaços, embora não pudessem proibir obras.

O presidente do STF em exercício na sessão, ministro Edson Fachin, ressaltou que o Estado deve garantir um ambiente escolar plural e democrático. “Não há verdadeira educação quando o medo substitui a reflexão”, declarou.