Sérgio Kelner Silveira, economista da Fundaj, escreve artigo sobre necessidade de atualização tecnológica de instituições governamentais
Sérgio Kelner Silveira | Publicado em 05/06/2025, às 10h30 - Atualizado às 12h05
Por Sérgio Kelner Silveira, em artigo para o site Jamildo.com
Vivemos uma era de ruptura tecnológica sem precedentes na pesquisa social. O avanço vertiginoso da inteligência artificial, da análise massiva de dados e das tecnologias digitais emergentes já impacta profundamente instituições públicas e privadas.
No entanto, a Fundação Joaquim Nabuco ainda opera — em sua maior parte — segundo lógicas, estruturas e práticas herdadas do século passado. O alerta é urgente: manter-se nesse compasso é aceitar a perda de protagonismo e o risco real da irrelevância institucional.
Não há mais dúvida de que as ferramentas digitais vão transformar o ciclo da pesquisa, da análise e do apoio à decisão pública. A questão é: quem será capaz de liderar essa virada? O futuro das instituições não está garantido pela tradição, mas pela capacidade de adaptação. No ritmo atual, a Fundaj se arrisca a ver sua influência reduzida e sua função social esvaziada — não por decreto, mas pela dinâmica inevitável da obsolescência.
Apesar de alguns pesquisadores da casa utilizarem IA para análise de dados quali-quantitativos e de existir um esforço recente da Diretoria de Pesquisas Sociais (Dipes) para aproximar ciência de dados e pesquisa social, essas iniciativas ainda são ilhas em um oceano de práticas analógicas. Falta institucionalização: não há estratégia clara que coloque ferramentas digitais avançadas no centro da agenda da pesquisa, da gestão e da comunicação.
Enquanto outras instituições públicas já automatizam fluxos de dados, produzem relatórios dinâmicos e monitoram indicadores em tempo real, a IA na Fundaj ainda é tratada como experimento lateral — e isso precisa mudar.
Computação neuromórfica e quântica são mais do que jargão futurista: estão na agenda dos grandes centros de pesquisa mundiais. Neuromórfica, inspirada no cérebro, promete eficiência inédita em análise de grandes volumes de dados; a quântica, por sua vez, abrirá horizontes para simulações e otimizações hoje impensáveis em políticas públicas.
É fato: ainda não há aplicações práticas consolidadas para o setor público nacional. Mas quem não começar agora a preparar equipes, parcerias e infraestrutura, ficará décadas atrás.
A Fundaj segue amarrada a modelos hierárquicos, processos decisórios lentos e cultura institucional avessa à experimentação. Iniciativas inovadoras dependem mais de vontade individual do que de planejamento institucional. É necessário romper essa lógica: sem isso, o salto tecnológico vira promessa vazia.
1. Institucionalização da inovação digital
Adoção sistemática de IA e automação em todas as rotinas. Dashboards, análises preditivas e monitoramento em tempo real não são luxo — são condição mínima para relevância.
2. Governança digital e ética
Políticas claras de ética, privacidade, segurança e interoperabilidade de dados, com transparência e accountability.
3. Estratégia tecnológica de médio e longo prazo
Plano institucional para acompanhar e incorporar novas tecnologias, a partir de parcerias e formação contínua.
4. Cultura organizacional aberta e experimental
Menos burocracia, mais estímulo à aprendizagem, erro construtivo e interdisciplinaridade.
A transformação digital já redefiniu o papel das instituições de pesquisa. O futuro será das que se reinventarem com base em estratégia, coragem e evidência.
Se a Fundaj não agir agora, será a irrelevância — não por decisão externa, mas por inércia interna.
A Fundaj tem história, equipe e reputação para ser protagonista da era digital na pesquisa social brasileira. Mas é preciso parar de apenas reagir: é hora de construir ativamente o futuro que queremos.
Sérgio Kelner Silveira é economista do NISP/Fundaj