Agência consulta reguladores internacionais e Ministério da Saúde pede doação emergencial à Opas em meio ao aumento de casos no país
por Plantão Jamildo.com
Publicado em 03/10/2025, às 12h05
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acionou agências reguladoras de diferentes países para acelerar a disponibilização do fomepizol no Brasil. O medicamento é considerado referência para o tratamento da intoxicação por metanol, mas ainda não possui registro no país.
Em nota, a autarquia informou: “A Agência já consultou formalmente autoridades reguladoras internacionais sobre a autorização de comercialização do produto em seus respectivos países (...) O objetivo é acelerar a aquisição do produto e garantir o atendimento aos pacientes no menor tempo possível”.
Entre as autoridades consultadas estão órgãos da China, União Europeia, Estados Unidos, Argentina, México, Canadá, Japão, Reino Unido, Suíça e Austrália. Paralelamente, a Anvisa publicou um edital de chamamento para identificar fabricantes e distribuidores internacionais com fornecimento imediato ao Sistema Único de Saúde (SUS).
De acordo com a última atualização do Ministério da Saúde, o Centro Nacional de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (CIEVS) registrou quase 60 notificações de intoxicação por metanol relacionadas a bebidas adulteradas em São Paulo, Pernambuco e no Distrito Federal. Há a confirmação de um óbito em São Paulo e outros sete em investigação.
Para coordenar a resposta nacional, a pasta instalou uma Sala de Situação. Em coletiva, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, informou que foi solicitado à Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) o envio imediato de 100 tratamentos de fomepizol e a aquisição de outras mil unidades por meio do Fundo Estratégico da entidade.
“Os pedidos e compras de antídotos que estamos fazendo são por precaução. Nos últimos anos, não ultrapassamos 20 casos por ano, mas temos observado um registro maior no estado de São Paulo. Essas são medidas preventivas do Ministério da Saúde”, disse Padilha.
O metanol é um composto industrial usado em solventes, combustíveis e outros produtos químicos. No organismo, transforma-se em formaldeído e depois em ácido fórmico, substâncias altamente tóxicas. O objetivo dos antídotos é bloquear essa metabolização.
O fomepizol bloqueia diretamente a ação da enzima que quebra o metanol, evitando a formação de formaldeído e ácido fórmico, os verdadeiros responsáveis pelos danos à visão e ao sistema nervoso, segundo o professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Raphael Garcia, ao OGlobo.
Uma alternativa usada em situações emergenciais é o etanol farmacêutico, administrado por via intravenosa, pois compete com a mesma enzima que metaboliza o metanol, com afinidade cerca de 50 vezes maior, reduzindo a formação dos metabólitos tóxicos. Mas é importante ressaltar que, em casos de suspeita, a pessoa deve procurar imediatamente atendimento médico”, explicou Diego Rissi, perito legista e toxicologista da Polícia Civil do Rio de Janeiro.
Atualmente, o uso do etanol farmacêutico é restrito aos 32 Centros de Informação e Assistência Toxicológica (CIATox) do Brasil, nove deles localizados em São Paulo. Para reforçar o atendimento, o Ministério da Saúde anunciou que, em parceria com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), estruturou um estoque estratégico de 4,3 mil ampolas do produto em hospitais universitários federais e outras unidades do SUS. Também foi iniciado o processo de compra emergencial de 150 mil ampolas adicionais, equivalentes a 5 mil tratamentos.
A Anvisa realizou ainda um levantamento que identificou 604 farmácias de manipulação aptas à produção de etanol farmacêutico em caso de necessidade. A agência informou que está “pronta para adotar medidas regulatórias que viabilizem a produção do etanol manipulado, caso essa estratégia seja aprovada pelo Ministério da Saúde”.
Nos quadros mais graves, quando já há acúmulo de ácido fórmico no organismo, especialistas indicam a hemodiálise como parte do tratamento, capaz de remover tanto o metanol quanto seus metabólitos.
O Conselho Federal de Química (CFQ) reforça que pequenas quantidades podem causar danos severos. “Apenas 10 ml já é suficiente para provocar cegueira, e 30 ml é considerada a dose mínima fatal para um adulto”. A presença de metanol em bebidas pode ocorrer por fraude, quando há substituição do etanol por metanol para reduzir custos, ou por falhas no processo de destilação em produções clandestinas.
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