Presidente do Sinpol diz que morte de ex-delegado geral de São Paulo mostra que Estado hoje está refém do crime organizado e sugere ações
Áureo Cisneiros | Publicado em 17/09/2025, às 08h51 - Atualizado às 09h21
Por Áureo Cisneiros, em artigo enviado ao site Jamildo.com
O delegado da Polícia Civil Rui Ferraz tombou no cumprimento do dever. Mais um homem de coragem que deixou família, amigos e colegas de profissão mergulhados na dor. A sua morte não é apenas mais uma estatística fria — é uma vida ceifada pela ousadia do crime organizado, é um vazio irreparável em um lar, é um golpe profundo no coração da nossa democracia.
Essa tragédia me faz lembrar do meu primo Biu agente, Comissário da Polícia Civil de Pernambuco, assassinado há mais de um ano e três meses também combatendo o crime organizado. Até hoje, ninguém foi preso.
A Polícia Civil cumpriu seu papel, apresentou investigações sólidas, provas consistentes, mas o Judiciário permaneceu inerte. Essa demora é mais do que inaceitável: é cruel. É como se dissesse às famílias que a vida de seus entes queridos não importa.
O crime organizado está se colocando como uma força poderosa, tentando se impor como um Estado paralelo, com armas, dinheiro e influência. Mas o poder público não pode, jamais, permitir que isso se crie, que isso se enraíze. Porque quando o Estado se cala, é o crime que fala. Quando o Estado se curva, é o crime que domina.
Atrás de cada policial morto, há filhos que crescem sem pai, esposas que choram sozinhas, mães que não encontram consolo. Mas não é apenas a polícia que perde: quando um policial é assassinado, toda a sociedade é atingida.
É a sensação de segurança do povo que se desfaz, é a linha de proteção que se rompe, deixando cada cidadão mais vulnerável.
E o combate ao crime organizado não pode depender apenas da bravura dos policiais. É preciso que o Executivo garanta recursos e estrutura, que o Legislativo produza leis duras e eficazes, e que o Judiciário cumpra seu papel de punir com rigor. Sem essa união, o sacrifício de tantos policiais continuará sendo em vão.
Também não é possível aceitar que facções continuem comandando o crime de dentro dos presídios. O sistema prisional precisa ser controlado com rigor, tecnologia e disciplina, para que deixe de funcionar como quartel-general do crime. Sem enfrentar essa realidade, qualquer esforço na rua será insuficiente.
Ainda é possível virar essa página. O Brasil já venceu outros momentos sombrios da sua história. Com coragem, planejamento e união, podemos vencer também o crime organizado.
Mas não é apenas uma luta das polícias: é uma luta de todos nós, como cidadãos. Se o povo se calar, o crime cresce. É hora de cada brasileiro exigir responsabilidade dos governantes e mais rigor do sistema de Justiça.
E aqui, deixo um apelo especial ao povo pernambucano, que convive diariamente com a violência e sente na pele o abandono da segurança pública. Pernambuco não pode aceitar viver sob o domínio do medo. É hora de se levantar, de cobrar mudanças e de apoiar aqueles que arriscam suas vidas para defender as nossas.
Por isso, faço também um apelo à governadora Raquel Lyra: é urgente reestruturar e modernizar a Polícia Civil de Pernambuco. Com mais de duzentos anos de história, nossa instituição carrega tradição e bravura, mas precisa de procedimentos investigativos modernos, tecnologia e inteligência policial para enfrentar o crime organizado.
Qualquer especialista em segurança pública sabe que não existe combate eficiente à violência sem investimento em investigação. Modernizar é, acima de tudo, salvar vidas.
E aqui deixo meu reconhecimento: mesmo sem as condições adequadas, são homens e mulheres que todos os dias saem de casa sem saber se voltam. Eles não se acovardam, não se omitem.
O mínimo que o Estado e a sociedade podem fazer é retribuir essa coragem com valorização e apoio.
Honrar a memória de Rui Ferraz, de Biu e de tantos outros policiais não é apenas erguer homenagens: é transformar a dor em ação. É dizer em alto e bom som que o Brasil e Pernambuco não ficarão reféns do crime organizado. Quem deve comandar é o Estado — nunca as facções.
Áureo Cisneiros é presidente do SINPOL-PE e apresenta-se como defensor da segurança pública como direito fundamental