Volume 15 das edições do Senado Federal apresenta o testamento político do Conde Maurício de Nassau, melhor prefeito em toda a história do Recife
por Jamildo Melo
Publicado em 04/10/2024, às 11h44
Jamildo Melo para CBN Recife (105.7 FM) − "Fala, Jamildo", de 04 de outubro de 2024.
Nesta sexta-feira, véspera de eleições municipais, gostaria de rememorar algumas das sugestões do CondeMaurício de Nassau, o melhor prefeito que o Recife já teve, em toda sua história.
O alemão partiu de volta para a Europa em maio de 1644, depois de divergências com a Companhia das Índias, sobretudo contra o rigor na cobrança de financiamentos aos senhores de engenhos, numa demonstração inequívoca da importância que dava ao ambiente de negócios.
Antes da partida, ele deixou aos sucessores, nobres e veneráveis da época, recomendações para seu governo. Ele disse que queria que fosse visto como último ato de governo, como memória, mas é uma espécie de testamento político de Nassau, depois de 380 anos.
"Por isto fui amado e respeitado", escreveu.
Como se sabe, depois de substituir Olinda como capital pernambucana, o notável administrador remodelou completamente o Recife.
Nassau promoveu o aproveitamento dos rios. 380 anos depois, aproveitamos o Capibaribe como tratamento de esgoto a céu aberto.
Ele também promoveu a abertura de canais, onde hoje jogamos lixo quando não aterramos.
Também ficou conhecido pela construção de pontes, em uma preocupação precoce com a mobilidade na capital.
A sugestão para a construção de novos palácios pode ser deixada de lado, mas existem várias sugestões ainda pertinentes.
"No tocante à arte da guerra, é de toda necessidade que mantenham o respeito e a honra que lhes pertencem. Este requisito é necessário a toda sorte de gente, mas para aqueles que governam a autoridade é uma das principais razões de estado e meio para conservação da República... só assim os troncos ilustres terão respeito e veneração"
"Não precisei exigir, desfrutar os ter recebido alguma coisa para meu proveito por graças, favores ou despachos por mim concedidos. Graças a Deus, posso declarar que nunca recebi favor ou emolumento e confio que vocês procederão do mesmo modo"
"Abstenham-se de lançar novos impostos, pois os tributos geram indisposição no povo. O povo é um rebanho de carneiros que se tosqueiam, mas quando a tosquia vai até a carne, produz infalivelmente dor. Como esses carneiros raciocinam, eles se convertem muitas vezes em terríveis alimárias (animais irracionais, do latim)"
"O País não deve ser esgotado de dinheiro corrente porque este é o músculo e o nervo. Sem eles, o corpo não pode ter nenhuma força"
"Ocupem sempre os lugares vazios com os mais dignos, não prestando ouvidos a paixões, a considerações de partido, da sociedade, a inoportunas recomendações e coisas semelhantes"
"Despachem e assinem petições com celeridade. Se assim não o fizerem, cairão no ódio e no descrédito públicos", afirmava, antes de criticar os costumes dos portugueses. "Os portugueses são submissos se forem tratados com cortesia e benevolência. É uma gente que faz mais caso de cortesia e de bom tratamento do que de bens"
"A audiência dos militares e o despacho de seus requerimentos ou pedidos devem ser de breve expediente. Sem que fiquem a espera muito tempo. O monarca não pode cair no tédio e na aversão dos seus soldados. Por maior que seja a estreiteza, não deixe faltar o necessários aos oficiais. Em caso de necessidade ou privação, depressa os fazem por de lado e esquecer o respeito. Pouco caso, desgraça na certa", afirma, em um tempo em que a discussão sobre guarda municipal armada estava posta.
"Quanto ao delito dos soldados, não sejam compassivos. Só pelo rigo se pode manter dedicada essa gente. A impunidade dos soldados os transvia e os corrompe facilmente"
"Aconselho que não permitam o uso de armas, salvo aos que tiverem documentos assinados do meu próprio punho", sugeria, revelando o temor de que o governo da Bahia formasse um exército com "os nossos moradores".
A exceção era dada aos holandeses, franceses e ingleses que fossem ao interior cobrar as suas dívidas. Ou os portugueses residentes no interior que podiam se atacados por negros do mato, tigres ou outros animais.
Nassau instaurou um clima de relativa tolerância religiosa.
"Nas coisas de igreja, é necessária tolerância e condescendência. Não se envolvam em disciplinas eclesiásticas e no que disto depende... deixem isto com seus padres e vigários... o contrário é sem utilidade à reputação, e vocês vão ter que ver com os seus sacerdotes. Não admitam queixas particulares em matéria de religião"
O governo do Brasil Holandês durou de 1637 a 1644.
Para nossa infelicidade, depois os portugueses agiram com intolerância e expulsaram os judeus, que acabaram indo ajudar a fundar Nova York. E nós perdemos o que poderia ter sido a nova Amsterdã das Américas.
@blogdojamildo