Otávio de Oliveira | Publicado em 06/10/2025, às 07h43 - Atualizado às 08h34
A empresa, em sua forma mais elevada, não é a soma de interesses particulares dos sócios. É, muito mais do que isso, um organismo vivo. Ele vive da confiança e respira através do cumprimento das responsabilidades com terceiros, incluindo a sociedade.
O administrador, dentro dessa arquitetura, decide mediante exercício da complexa racionalidade que transita da frieza dos números à energia do espírito humano. Não se administra apenas recursos: administra-se, sobretudo, consequências.
Governar uma empresa é, primeiro, um ato de pensamento; depois, execução. Exige-se daquele que a dirige não somente o domínio sobre o negócio, mas, igualmente, a capacidade de compreender o que nele se oculta - o impulso, o mercado, a expectativa e o erro que permeiam cada decisão.
Os contratos sociais definem limites à atuação do administrador, mas é no caráter que se encontra e se determina o rumo da empresa. Por isso, o verdadeiro administrador é aquele que compreende a diferença entre refletir-para-agir; e, não, simplesmente operar.
O Direito, ao definir os deveres de diligência, lealdade e informação, só toca a superfície do problema. A escorreita administração não nasce das imposições de regras, mas da lucidez moral e intelectual do administrador.
Administrar é exercer a fé na continuidade do negócio. Ao exercê-la, impõe-se coragem de resistir à tentação do pragmatismo cego que transforma, em segundos, a eficiência em ineficiência. A ineficiência em demissões e essas em provável declínio acelerado da empresa. A boa administração, portanto, não é a mais célere; é a mais refletida. A lentidão que pondera é preferível à pressa que destrói.
O risco é a condição da liberdade empresarial; já o risco inconsequente é a sua negação. Administrar é equilibrar-se entre a prudência e a audácia – são dois extremos que só a inteligência do real pode conciliar. A omissão, sob o disfarce da cautela, é forma de covardia; já a precipitação, sob o pretexto de iniciativa, é desatino. A virtude administrativa está na serenidade ao enxergar os números e na consciência de que toda decisão carrega um traço de irreversibilidade.
Por outro lado, a governança corporativa, quando bem compreendida, não é uma técnica de controle. Trata-se de uma verdadeira pedagogia da responsabilidade: obriga os centros de poder a se justificar; impõe luz onde o instinto buscaria sombra. Em última instância, é o modo institucional de civilizar o impulso humano. Sem governança, o instinto de exercer o poder pode, potencialmente, se transformar em arbitrariedade.
A empresa moderna exige administradores que saibam pensar. Não o pensamento abstrato. O pensamento concreto. Aquele que, antes de decidir, distingue o que é possível do que é ético, e o que é ético do que é apenas conveniente. O destino das instituições depende, cada vez mais, dessa consciência.
Não basta gerar riqueza. Não basta conquistar resultados; é necessário sustentá-los. A empresa sobrevive quando o seu administrador compreende que prosperidade sem integridade é apenas sucesso aparente. O sucesso aparente é a forma mais refinada de ruína.
O administrador, portanto, também é o guardião dos valores e do espírito da empresa. A ele cabe perpetuá-los, protegendo-a da amnésia moral que o mercado frequentemente impõe. E, talvez, essa seja a mais alta de suas funções: impedir que a racionalidade do lucro destrua o fundamento humano, porque nenhuma prosperidade resiste ao vazio ético.
*Por Otávio de Oliveira, articulista e advogado
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