Tema uniu PT e PL em assinaturas de CPI para investigar a adultização de crianças na internet. Tema repercute após vídeo do youtuber Felca
por Cynara Maíra
Publicado em 12/08/2025, às 12h25 - Atualizado às 13h04
O Senado Federal superou o número mínimo de assinaturas para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar influenciadores digitais e plataformas que expõem crianças e adolescentes a conteúdos de caráter sexualizado.
Até agora, 60 senadores de diferentes partidos apoiam o pedido, que deve ser lido em plenário pelo presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), para que o colegiado seja instalado.
A iniciativa conta com nomes da direita e da esquerda, incluindo Jaime Bagattoli (PL-RO), Damares Alves (Republicanos-DF), Humberto Costa (PT-PE) e Paulo Paim (PT-RS). A mobilização ganhou força após a repercussão do vídeo “Adultizando”, produzido pelo youtuber Felca, que denuncia supostos casos de exploração sexual e superexposição de menores nas redes sociais.
Com as assinaturas validadas, a CPI terá poderes de investigação semelhantes aos das autoridades judiciais, podendo convocar ministros, ouvir testemunhas e solicitar informações a órgãos públicos.
A expectativa é de que os trabalhos aprofundem a apuração sobre a responsabilidade de plataformas e criadores de conteúdo que contribuem para a adultização de menores e para a exploração sexual na internet.
Embora o vídeo de Felca tenha catalisado a atenção para o tema, a discussão sobre a adultização infantil e a violência sexual contra crianças e adolescentes já vinha crescendo no país.
Em maio, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação de Pernambuco (Sintepe) lançou a campanha e a cartilha “Prevenção ao Abuso Sexual”, distribuída em escolas da rede pública estadual.
A iniciativa reúne dados alarmantes: segundo o IBGE, uma em cada cinco estudantes no Brasil já sofreu algum tipo de violência sexual.
O Ministério da Saúde confirma que, entre 2015 e 2021, o número de notificações envolvendo crianças e adolescentes aumentou.
A presidente do Sintepe, Ivete Caetano, destacou na época que “a escola pública, muitas vezes, se transforma no único refúgio diante das adversidades e o papel do professor é essencial na construção da cidadania e na proteção desses estudantes”.
O Defensor Público Federal André Naves, especialista em Direitos Humanos e Inclusão Social, avalia que o fenômeno exposto no vídeo vai além da questão da exposição online.
“O documentário cumpre um papel brilhante ao escancarar a perversidade da adultificação infantil e os perigos da superexposição de crianças nas redes sociais. A obra é um alerta indispensável contra uma cultura que flerta perigosamente com a exploração e até com o incentivo à pedofilia. Recomendo que todos assistam”, afirmou.
Para Naves, o problema atinge uma dimensão estrutural que envolve a forma como a educação é percebida e oferecida.
“Entre uma cena e outra de crianças imitando rotinas e vaidades ostentatórias de adultos, emerge um sintoma assustador: o desprezo explícito pela educação. Para essas crianças, a escola é um peso, o conhecimento é um obstáculo e o sonho não é ser, mas ter. Esse materialismo ofusca pilares como o trabalho, a ética e a própria construção do saber”, disse.
Ele aponta que culpar apenas os pais é insuficiente, que também podem ter passado por negligências na infância. Segundo o defensor, a solução exige repensar a educação para além do currículo tradicional.
“Não é decorar fórmulas, mas desenvolver raciocínio lógico; não é acumular informações, mas cultivar habilidades socioemocionais. Em um mundo onde a inteligência artificial avança para automatizar tarefas técnicas, o que nos restará de essencialmente humano será nossa capacidade de colaborar, criar e resolver problemas complexos com um olhar que a máquina não possui".