Raimundo Carrero: Sedução literária no Dia Mundial do Livro

O escritor Raimundo Carrero profere aula magna na Escola Superior de Advocacia da OAB-PE, em celebração ao Dia Mundial do Livro

Jamildo Melo

por Jamildo Melo

Publicado em 25/04/2025, às 10h21 - Atualizado às 11h14

Carrero, tido como mestre das palavras e um sedutor literário, na OAB, ao lado do advogado Carlos Barros - Divulgação
Carrero, tido como mestre das palavras e um sedutor literário, na OAB, ao lado do advogado Carlos Barros - Divulgação

Pelo autor, não pelo narrador

Por Carlos Barros, em artigo especial para o site Jamildo.com

— Ele chegou! — anunciaram com alvíssaras que só são vistas em antessalas de maternidades.
Em pouco tempo, já se via ele — apoiado com cuidado por braços afetuosos — caminhando com passos curtos no extenso corredor, esbanjando a graça de criança.

A espontaneidade dos sorrisos e brincadeiras direcionados aos que estavam no entorno seduzia a todos já ao longo daquela lenta caminhada.

Os mesmos risos e gracejos genuínos tornavam verdadeiramente leves, aos olhos de todos, o peso dos proclamados setenta e sete anos de estrada e dos efeitos de um tropeço da saúde — por ele comentados sem segredos.

Aliás, os sinais do tempo, embora ditos e reditos por ele, eram secundarizados por todos diante do espírito jovial que se via, próprio de quem vive em arte e transforma em arte a arte de viver — elevando ideias, histórias e palavras ao estado da arte.

E, apesar de terem ido ao seu encontro para ouvi-lo explanar, em Aula Magna, sobre a “Sedução do Leitor” através da escrita, sua fala sedutora — veículo circunstancial do seu vasto, denso e arrebatador conteúdo — encantou os presentes até as últimas horas da noite, como é comum quando se ouve alguém que não apenas tem, mas é, em si, uma imensa bagagem literária e humanística.

Essa foi a atmosfera levada por Raimundo Carrero — mestre das palavras e um sedutor literário —, em celebração ao Dia Mundial do Livro (23/04), para a advocacia pernambucana e os amantes da boa literatura.

Foi esse o sabor — refinado e inesquecível — do caldo de cultura mais uma vez oferecido pela Escola Superior de Advocacia da OAB-PE: uma homenagem simultânea ao autor, à obra e ao leitor.

Celebrado por sua autenticidade e obra robusta, Carrero não precisou de atalhos, aparições forçadas ou títulos autoproclamados.

Enquanto uns tentam colocar um jabuti em cima da árvore, Carrero tem em casa um Prêmio Jabuti pela obra As sombrias ruínas da alma (1999).

Enquanto outros, casmurros, arvoram-se de literatos, aquele grande escritor pernambucano venceu o Prêmio Machado de Assis da Fundação Biblioteca Nacional com o seu A minha alma é irmã de Deus (2009).

Enquanto, de supetão, vários tentam emergir como os novos “Bruxo do Cosme Velho”, Raimundo — com voz própria — conquistou outro Prêmio Machado de Assis com Somos pedras que se consomem (1995).

A densa produção de Raimundo Carrero — sertanejo com orgulho, como ele próprio fez questão de afirmar — foi forjada na escrita e reescrita diárias. Para ele, literatura é uma missão — em suma, humanística.

A propósito, esse entendimento, conforme destacou, foi sempre partilhado com seu amigo, mestre e colega de trincheira no Movimento Armorial, Ariano Suassuna — Ariano que, inclusive, também honrou a Escola da OAB-PE ao propiciar à advocacia, ainda na década de 1980, uma Aula Magna que contribuiu significativamente para a missão cultural e formativa da aludida academia.

Na noite em que Carrero esteve na ESA-PE, viu-se um escritor apaixonado pelo ofício — mas cuja paixão é conduzida com técnica. Um autor, apesar da experiência, ainda entusiasmado a ponto de escrever dois livros ao mesmo tempo — sim, um em cada turno. Um literato que, do alto de seus quase oitenta, faz da cadência desacelerada dos seus passos o contraste de uma produção extremamente pulsante, com obras no prelo e outras na iminência de serem escritas — muitas, pelo que se depreende.

Na noite em que o referido imortal da Academia Pernambucana de Letras esteve na academia da advocacia pernambucana, vivenciou-se o encontro entre leitores seduzidos e o autor das obras sedutoras. Ouviram-se testemunhos de outros mestres que, em sala de aula, passaram aos seus alunos a leitura de obras do mencionado mestre da escrita, como parte essencial da formação. Presenciaram-se revelações de grandes profissionais da advocacia no sentido de que, ainda colegiais, foram arrebatados pelas obras do mestre sertanejo.

Experimentaram-se, ao vivo e em cores, os verdadeiros sentidos das palavras “conhecimento” e “generosidade” — o que, registre-se, não surpreende, dado que a oficina literária capitaneada pelo velho-jovem escritor existe desde a década de 1980. Observou-se, ali, a verdadeira fusão entre quem ensina e quem encanta — e entre quem aprende e quem é encantado.

Enfim, naquela noite de verdadeira cultura, leitores seduzidos pela obra de Raimundo Carrero foram novamente seduzidos.

Desta vez, porém, pelo autor, não pelo narrador — lição aprendida, mestre.

Carlos Barros é advogado criminalista e Diretor Geral da Escola Superior de Advocacia da OAB-PE