Novos trabalhadores rejeitam CLT e MEI e regulação de aplicativos como iFood naufraga

Jamildo Melo | Publicado em 19/08/2024, às 08h27

Entregadores do Ifood e outros aplicativos rejeitam sistema de regulação do trabalho - Fernando Frazão/Agência Brasil
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Com as eleições municipais, que mobilizam vários deputados federais, foi para o espaço, definitivamente, a discussão do projeto de lei 12/2024, que debate no Congresso Nacional a regulamentação do trabalho por motoritas de aplicativos . A discussão foi zerada no governo Lula, para estagnar de vez, depois de um ano e oito meses de discussão.

Quem acompanha o tema relata que o projeto está natimorto, não passa da primeira discussão, depois que dois relatórios foram apresentados e rechaçados. Como não anda mais este ano, é bem provável que só volte no próximo ano, depois das eleições da Mesa da Câmara dos Deputados. O que se diz é que o maior erro foi tentar pegar o Uber como parâmetro.

No momento, são grandes as interrogações. O governo Lula vai trocar de interlocutor, uma vez que Marinho já demonstrou que não mudará a posição histórica das centrais sindicais? Haveria outro ministério capaz de assumir o desafio?

O Congresso pode resolver por conta própria? Ou o STF pode decidir sozinho? Por 8 votos a 3 a Corte entendeu que não se aplica a CLT, uma vez que a discussão é sobre tecnologia.

Quem acompanha as discussões percebeu que os problemas começaram quando o ministro do Trabalho, Marinho, criou um grupo de trabalho com 45 pessoas, sendo 15 do governo, 15 das empresas e 15 dos trabalhadores (leia-se sindicatos). E previu que as decisões seriam por consenso. Como são em sua maioria autônomos, a categoria não quer nem ouvir falar de CUT e UGT, nas discussões da regulação, que, na prática, significou custos adicionais.

As discussões no Ministério do Trabalho resolveram a questão da insegurança jurídica para as empresas (iria para o ministério dos Transportes, se fossem empresas de transporte), mas o reconhecimento de que eram empresas de intermediação do trabalho importaram o velho problema de previdência da CLT. A avaliação de que o projeto não iria ficar de pé mostrou-se real.

Para os críticos do projeto proposto, a A CLT é de 1937, não podendo servir para o momento atual.

"Se serviu em 1964, não tem espaço para um novo mercado de trabalho de 2024. Como estabelecer alíquotas progressivas, até 27,5% para o cara que faz R$ 50,00 em um dia de corrida? Nem mesmo o MEI serve aos autônomos também, uma vez que eles não querem um salário mínimo de aposentadoria. A opção deles vai ser levar a vida fazendo bico e pedir BPC no futuro, sem pagar um real para a Previdência", afirmam fontes da coluna eletrônica.

Pelos cálculos de mercado, só 7% da base iria entrar na Previdência oficial, porque a maioria se vira com outras atividades, muitas delas informais, fora das plataformas digitais conhecidas. Por isto a maioria rejeita a proposta do governo.

A saída pode ser a criação de regras novas, para os novos tempos. Sabe-se que as empresas do setor  assumiram o compromisso de fazer o pagamento da quota-parte.

"A Previdência é algo novo para estes trabalhadores. Temos um mercado novo e novos modelos de trabalho. Então, parece lógico que precisamos de regras novas. Hoje, é um CNPJ e é o seu empregador que alimenta. No caso dos autônomos, de aplicativos, cada uma das partes aplicaria a sua quota-parte no CPF dele. É inovador e teria como se garantir a sustentabilidade", explicam fontes do site.

Direita ou esquerda?

O governo Lula foi avisado de que o projeto incendiaria a Direita, no Congresso, quando se colocou no projeto de lei 12/2024, a obrigação de sindicalização do trabalhador. Assim, o trabalhador dos aplicativos abre mão da CLT, ele simplesmente não quer. Qual  a razão? Em geral, ele não trabalha oito horas, são em muitos casos duas horas, com o "corre" no período do almoço e jantar.

Ainda no poder, o bolsonarismo soube capitalizar os sinais dos novos tempos. Consta que o ex-presidente Bolsonaro galvanizou a categoria, nas eleições passadas, quando, em uma live, anunciou que a CNH passaria a valer dez anos e não apenas 5 anos. Bem como elevou a quantidade de pontos na carteira de 20 para 40.

Mesmo nos meios políticos, algumas pessoas ainda não perceberam, mas a carteira de habilitação (CNH) é o único instrumento de cidadania destas pessoas. São trabalhadores que precisam dela para fazer o "corre" e arrumar R$ 500 para pagar a conta de luz, é o que se ouve na categoria.

Não é que o entregador seja bolsonarista, ele é simplesmente anti-estado. Para eles, o Estado só se apresenta na forma de taxas e falta de assistência. Como isto se dá? O Estado é o repressor com as blitz e esculacho, quando a moto está com atraso.

Na entrevista que concedeu {a CBN Recife, o ex-presidente Bolsonaro comentou o projeto, a partir de um questionamento do blog do Jamildo.

A questão é importante econômica e socialmente porque a intermediação do trabalho por meio de aplicativos é um caminho sem volta. Em 2019, antes da pandemia, o número de entregadores delivery era 10% do que é hoje. A pandemia só forçou empresas e autônomos a buscarem a alternativa das empresas de tecnologia. No caso do iFood, por exemplo, eram 10 milhões de pedidos mensais. Em agosto de 2024, são 100 milhões de pedidos por mês.

O processo de digitalização das empresas está apenas no começo (muitos ainda usam o WhatsApp, inadequado quando um negócio ganha escala). Movimentando 0,5% do PIB brasileiro, a base de cadastro das empresas de intermediação tem mais de um milhão de cadastrados. Efetivos por mês, são 900 mil empregos gerados nos setores de restaurantes e supermercados.

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